domingo, 12 de fevereiro de 2012

JOSÉ PINTO MARTINS, UM CHARQUEADOR COMO TANTOS*




A. F. Monquelat
V. Marcolla


Atualmente sabe-se que Pelotas não foi a pioneira no estabelecimento da indústria saladeiril no Continente de São Pedro; tal primazia, por ora, cabe ao atual município de Arroio Grande.
Demonstrou-se sobejamente que a João Cardoso da Silva, e não a José Pinto Martins, se deve tal iniciativa. Ainda que não tenha sido a pioneira, é a Pelotas que o Rio Grande do Sul deve o desenvolvimento desta indústria. No entanto, afastada a ideia que até então havia, a de ter sido José Pinto Martins o fundador da indústria saladeiril no Continente de São Pedro, nos resta saber se, pelo menos, em Pelotas foi ele o pioneiro.
Em trabalho publicado no Diário da Manhã de 22 de janeiro do corrente ano, a página 15, disse a professora Zênia de León no primeiro parágrafo de seu artigo: “A vida econômica de Pelotas iniciou há bem mais de duzentos anos passados. Segundo recentes, bem vindas e benéficas pesquisas, que o resgate de verdades é infinito, antes de José Pinto Martins aqui ter chegado em 1777, já se trabalhava a carne salgada na região. Coube a ele, entretanto, a primazia no sítio charqueadista pelotense e a disseminação das charqueadas na região hidrográfica do rincão-arroios e canal de São Gonçalo”.
A autora de “200 Anos de Pelotas – A face de Pelotas que muitos viram” ao se referir as “recentes, bem vindas e benéficas pesquisas” que, embora não explicitadas pela articulista, em face dos aspectos tratados no parágrafo aqui reproduzido, são as nossas, realizadas e divulgadas, há anos, nos domingos, pelas páginas do DM, tornou a primeira representante da historiografia local a registrar, pela imprensa, o diálogo com uma nova concepção de história de Pelotas.
Relativamente à afirmação de que “A vida econômica de Pelotas [ter iniciado] há bem mais de duzentos anos”, vale dizer que a cidade, no período compreendido entre 1781 até o final do século XVIII teve sua incipiente economia, com mão de obra escrava, baseada no agro-pastoreio praticado nas sesmarias e datas concedidas aos “Cazaes” assentados nas terras do capitão Inácio Antônio da Silveira Cazado e do capitão-mor Manoel Bento da Rocha, pelo então governador da Província, Sebastião Xavier da Veiga Cabral da Câmara, nome este que deve ser lembrado como um dos vultos mais importantes para o surgimento e desenvolvimento de Pelotas.
Quanto ao português, natural de Meixomil, José Pinto Martins, já demonstramos documentalmente que aqui não estava em 1780, como até agora quis a historiografia, não só pelotense, e menos ainda esteve no ano de 1777, como apontou a redatora do artigo mencionado.
José Pinto Martins na data indicada pela autora, havia chegado a pouco no Brasil e estava transitando entre as cidades de Aracati, Mossoró, Recife e, para o Continente de São Pedro, é provável que tenha vindo nos anos 90 do século XVIII, como já o dissemos em artigo publicado sobre título de “José Pinto Martins e seus irmãos (3ª e última parte)”DM de 08 de janeiro de 2012, p. 13.
Considerando a afirmação feita pela professora Zênia de León, de que “Coube a ele [José Pinto Martins], entretanto, a primazia no sítio charqueadista pelotense a disseminação das charqueadas na região hidrográfica do rincão-arroios e canal São Gonçalo” temos a dizer o seguinte: se tal tivesse acontecido, que importância teriam as “recentes, bem vindas e benéficas pesquisas”? Ou melhor dito: da forma que a articulista expressou, fica entendido que José Pinto Martins é o pioneiro da indústria saladeiril na região, agravado ainda pelo fato de sua primazia ter ocorrido no ano de 1777, quando é quase unanimidade historiográfica o ano de 1780.
Mais incisivamente temos a acrescentar que a José Pinto Martins o Rio Grande do Sul nada deve do que incluí-lo na lista de nomes de centenas de outros charqueadores; a José Pinto Martins Pelotas e sua história nada mais têm a dizer que foi um dentre dezenas de outros charqueadores que aqui se estabeleceram. Além disso, diga-se que José Pinto Martins não esteve ou estava em Pelotas nos anos de 1777-1780.
Se não foi José Pinto Martins o primeiro a charquear, de forma não doméstica, nas terras que deram origem a cidade de Pelotas, a pergunta é: quem foi o pioneiro da indústria saladeiril pelotense?
Embora nossas pesquisas sobre tal assunto estejam em andamento, podemos hoje, grosso modo, dizer que o pioneiro da indústria saladeiril em Pelotas foi o proprietário da sesmaria do Monte Bonito, capitão Inácio Antônio da Silveira Cazado que, em tais terras e próximo a margem do arroio Santa Barbara estabeleceu uma charqueada com finalidade de comércio dos produtos ali fabricados, cuja indústria teve a denominação de “Charqueada do Santa Bárbara”, próxima da qual estabeleceu também uma Olaria.
Quando concluirmos a pesquisa sobre o capitão Inácio Antônio da Silveira Cazado e seus estabelecimentos, à margem do Arroio Santa Bárbara, voltaremos a tratar deste assunto.


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* Artigo publicado no Jornal Diário da Manhã, no dia 12 de fevereiro de 2012.

domingo, 5 de fevereiro de 2012

O POVOAMENTO DE PELOTAS (39)*




A. F. Monquelat
V. Marcolla


As Datas e Sesmarias na Serra dos Tapes e São Lourenço do Sul

João Francisco Ferreira

Em petição enviada a Corte, disse João Francisco Ferreira que requerendo ao Vice-rei, que foi do Estado, Don Fernando José de Portugal, Conde de Aguiar, “uma légua e um quarto de terras na Serra dos Tapes, Continente do Rio Grande, no fim da testada da fazenda de D. Rita Leocádia Pereira de Lemos pela parte do Leste; e, com as datas da Picada grande de Salvador Jorge, Balthazar Gomes, José e Agostinho e outros pela parte do Sul; e, pelo fundo do Norte, com o Arroio de Pelotas; e, fundos pelo Oeste com terras devolutas da dita Serra; a fim de que o Suplicante possa estabelecer fazendas de criação de gados, culturas e o mais que a mesma terra for capaz; e, foi mandado fazer, primeiramente, as diligências do estilo, por cuja razão requereu o Suplicante Medição, o que, por seu despacho mandou fazer o Dr. Juiz de Fora, Órfãos e Medições daquela Capitania de São Pedro do Sul e que, para efeito se procedeu em citação dos ereos confinantes e que, depois de feita, se julgou por Sentença [...]”.
Ferreira encerrava a Petição requerendo a confirmação de sua Carta de Sesmaria, no que foi atendido aos trinta dias do mês de outubro de 1809.

Gonçalo José de Oliveira e Silva

Por volta dos primeiros meses do ano de 1814, Gonçalo José de Oliveira e Silva requereu ao governador Dom Diogo de Souza a concessão de umas terras, dizendo-se casado e morador no Distrito da Vila do Rio Grande e que, nos fundos da estância do Capitão Ignacio da Silveira, entre o arroio de Santa Bárbara e o de Pelotas, denominada Monte Bonito, “existem terras devolutas em direção à Serra dos Tapes; e, porque o Suplicante nunca obteve a graça de algum terreno e tem possibilidades de entrar em plantações, por serem os ditos terrenos de matos e campestres, roga a V. Excelência se digne conceder-lhe, por Carta de Data, a extensão correspondente a setecentas braças de frente com mil e seiscentas de fundos, fazendo a frente, nos fundos para a Serra dos Tapes, dividindo-se por um lado com o Arroio Pelotas; e, por outro, com terras de Manoel Alves Morais; compreendendo matos faxinais e campestres [...]”.

O Despacho de Dom Diogo de Souza

Informe o Comandante do Distrito, ouvindo os ereos [vizinhos/lindeiros]. Palácio de Porto Alegre, 16 de setembro de 1814.

O Comandante do Distrito

Em observância do despacho retro de [...], do Excelentíssimo Senhor Capitão Geral, antecessor de V. Exª., passei a me informar com os ereos do requerimento anexo e não se ofereceu dúvida alguma e, é certo estarem as terras devolutas e tudo mais que o Suplicante alega, é verdade. É o quanto posso informar a V. Excelência, que mandará o que for servido. Distrito de Pelotas, 21 de dezembro de 1814. Manoel Soares da Silva, Sargento-mor comandante do Distrito.

Joaquim José de Assunpção

Em requerimento encaminhado ao Marquês de Alegrete, disse Joaquim José de Assunpção, que ele, Suplicante, “tem por notícia, que na Serra dos Tapes se acham umas terras devolutas, que terão meia légua de frente e uma de fundo; sendo, estas, sitas nos fundos das terras de João de Matos, que fazem frente ao rumo do Sul; e, pelos fundos, em direção ao Norte e para a parte Leste, com terras requeridas por José da Rosa Lisboa; e, pela parte do Oeste, com terras requeridas por João Machado. E, porque o Suplicante ainda não obteve graça alguma de Sesmaria, motivo pelo qual recorre a [...]”.

O Governador

Informe o Doutor Ouvidor Geral e Corregedor da Câmara, procedendo as diligências do estilo. Quartel General de Porto Alegre, 22 de novembro de 1815.

O Ouvidor Geral

Informe a Câmara do Distrito, procedendo as diligências do estilo. Porto Alegre, 7 de dezembro de 1815.

A Câmara de Rio Grande

Cumpra-se. Rio Grande, em Câmara de 7 de fevereiro de 1816.

Ana Joaquina Rosa de Jesus

Dona Ana Joaquina Rosa de Jesus, viúva e moradora na Vila do Rio Grande, dizendo haver no Termo da Vila, no lugar denominado Serra dos Tapes umas terras devolutas, “sertão inculto”, e até então a Suplicante não possuir terreno algum e tampouco ter obtido a graça de concessão de Sesmaria e tendo possibilidades “para praticar a agricultura, roga a V. Excelência se digne conceder-lhe, por Sesmaria, meia légua em quadro de terras, compreendendo matos faxinais e campestres, que se encontram assim compostos: fazem frente no fundo da Sesmaria pedida por Joaquim José da Costa Campelo, no quadrante do Sul; no de Leste, com terras pedidas por Thomas Francisco Flores; e, pelo Oeste, com terras pedidas por Antônio Godinho Ramos; portanto [...]”.

O Despacho do Governador

Informe o Doutor Ouvidor Geral e Corregedor da Câmara, procedendo as diligências do estilo. Palácio de Porto Alegre, 15 de fevereiro de 1815. Marquês do Alegrete.

O Ouvidor

Indorme a Câmara do Distrito, procedendo nas diligências do estilo. Porto Alegre, 18 de fevereiro de 1815.

A Câmara

Cumpra-se. Rio Grande, em Câmara de 1º de março de 1815. Várias assinaturas.

Petição à Câmara

Em petição à Câmara de Rio Grande, desse Dona Ana Joaquina que, pelo documento anexo, mostrava ter requerido uma porção de terras ao Governador e que, em consequência disto, mandou que se procedesse nas diligências do estilo; por isso, “pede a V. Mercês sejam servidos mandar passar os Editais [...]”.

A Câmara e os Editais

Como pede. Rio Grande, 1º de março de 1815. Várias assinaturas.

Os Editais

O Juiz Presidente e demais Oficiais [vereadores] da Câmara desta vila e etecétera: Fazemos saber que Dona Ana Joaquim Rosa de Jesus requereu por Sesmaria […]. E, porque assim nos foi determinado pelo dito Ministro, mandamos passar três Editais, que serão publicados e afixados nesta Vila, na Capela do Povo Novo e Freguesia de São Francisco de Paula de Pelotas, onde estarão por trinta dias […].
Em Câmara de 14 de março de 1815”. (Várias assinaturas)



Continua...

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Nota: Os documentos transcritos foram atualizados e paleografados pelos autores.
* Artigo publicado no Jornal Diário da Manhã, no dia 05 de fevereiro de 2012.