domingo, 14 de novembro de 2010

APONTAMENTOS PARA UMA HISTÓRIA DO CHARQUE NO CONTINENTE DE SÃO PEDRO (14)*


A. F. Monquelat
V. Marcolla

O homem desaparecido, segundo palavras do Vice-rei do Brasil, estava de volta à Corte, onde peticionou à Rainha, dizendo lhe que sendo autorizada a inspeção nas Salinas de Cabo Frio, no intuito de saber qual dos sais do país era mais apropriado e útil à Real Fazenda na salga das carnes do Rio Grande, e que tendo desempenhado sua missão com toda a atividade e zelo, fazendo aprontar e ensinando a preparar os tanques “para este importante fabrico”, portou-se ao mesmo tempo “com a maior suavidade com os povos, e sem os vexar de modo algum”. E que de todas as suas ações tinha dado conta a Sua Majestade através da Secretaria de Estado dos Negócios Ultramarinos.
Disse, ainda, Alexandre que não obstante os bons serviços, “é infeliz em um requerimento que fez a V. Majestade, porque, tendo-se queixado das violências que tinha sofrido”, fato de que ela estava a par, informada que fora da verdade pelo Vice-rei do Brasil, e que, apesar disso, Sua Majestade havia despachado que os papéis fossem remetidos ao Conselho Ultramarino para que este, depois de ouvidas as partes, desse o seu parecer.
Não satisfeito com a decisão tomada pela Rainha, pois entendia ele que a “verdade do negócio” já era conhecida pela informação do Vice-rei, que havia procedido às mais exatas e verídicas averiguações, portanto, entendia Alexandre, que aquele procedimento determinado pela Rainha só serviria para que houvesse uma demora na decisão, o que por sua vez, considerando as distâncias, seria uma nova violência contra o Suplicante, dado o dilatado tempo que decorreria.
Alexandre encerrava a petição recorrendo a Sua Majestade para que, “declarando o Aviso incluso, se digne determinar ao Conselho o ponto da Audiência das partes, para que, achando o mesmo Tribunal necessário que sejam ouvidas as partes, as mande ouvir; e achando que o foram, ou que para a decisão não é necessária a Audiência, decida sem esta”.
A petição de Alexandre foi recusada. Daí o vermos requerendo que lhe fosse passado por Certidão o teor do Aviso que, a seu favor, o Conselho Ultramarino havia despachado.
O teor do Aviso solicitado por Alexandre é o seguinte: “Para o Conde de Rezende: Ilmº e Exmº Sr., Sua Majestade manda remeter ao Conselho Ultramarino a informação inclusa, de nº 116, do Vice-rei do Estado do Brasil, sobre a queixa que fez Alexandre Inácio da Silveira, para que o mesmo Conselho, procedendo o exame deste negócio, e ouvida as partes interessadas, decida com efeito o que parecer”.
Este Aviso havia sido enviado ao Vice-rei por Dom Rodrigo de Souza Coutinho, em 19 de setembro de 1798.

As opiniões do Vice-rei sobre Alexandre Inácio da Silveira, e as atitudes tomadas quanto às Salinas de Cabo Frio
Em ofício dirigido a D. Rodrigo de Souza Coutinho, informou o Conde de Rezende que em virtude do ofício de 28 de abril de 1798, havia tomado a liberdade de ordenar ao Coronel de Milícias de Cabo Frio, que de comum acordo com a Câmara daquele Distrito, convencessem os moradores a beneficiarem as Salinas, “que com larga mão lhes oferece a Natureza, e até agora deixadas em desprezo pela proibição que há, de fazerem o comércio do sal, utilizando-se escassamente daquele, que sem cultura alguma se produzia”.
Participou, também, que antes desta sua deliberação tinha atendido todas as providências requeridas por Alexandre Inácio da Silveira, a fim de dar conta das diligências que a Corte lhe havia incumbido; “mas, este homem volúvel, e sem crédito nesta Praça, coisa nenhuma fez em Cabo Frio, respectiva à sua incumbência e benefício daquele povo, o qual, animado por suas promessas, logo tratou de beneficiar as Salinas, que, em seguida, também ficaram no antigo estado, assim que ele, dali, inopinadamente, se retirou sem ao menos me participar o motivo desta sua não esperada resolução”.
Prossegue o Vice-rei acrescentando que além do peso daquelas razões, e em especial a grande falta de sal que se fazia sentir em sua Capitania e outras mais, enviara um Oficial engenheiro a Cabo Frio para que pusesse em prática as determinações ajustadas entre a Câmara e o Coronel do Distrito para que promovessem a “cultura das Salinas, incumbindo-se particularmente da distribuição do terreno entre os que se dispusessem a beneficiá-las”.
Encerrando o Ofício, informava ter recebido cartas do Oficial Engenheiro e cópia do Edital que haviam mandado fixar nos lugares públicos da cidade de Cabo Frio, e que os estava enviando, em forma de cópias, para que “V. Exª. tenha individual conhecimento de tudo quanto se tem praticado a este respeito, e persuadido de que estas minhas diligências, nascidas unicamente do desejo de precaver a ruína destes povos, e ainda o atraso da Fazenda Real, não poderão ser eficazes sem a aprovação de S. Majestade, o que será em benefício comum de todo o Estado”.
Anexos ao Ofício do Vice-rei, datado de 28 de outubro de 1798, estavam os documentos citados, com os seguintes teores:

Carta de Felicíssimo José Victorino de Souza (datada de Cabo Frio em 27.09.1798)

“[...], logo que cheguei a este Distrito, não perdi tempo em avistar-me com a Câmara, para dar execução à Ordem que V. Exª. foi servido dirigir-me em 24 de abril do presente ano; e no dia 26 do corrente mês me achei na Câmara desta Cidade, estando presentes o Juiz, Camaristas [vereadores] e o Engenheiro José Correa Rangel, e na mesma ocasião acertei com a Câmara em limpar-se as Salinas, na forma que se havia combinado na última vez em que tratamos sobre este assunto; com a única diferença de se reservar duas ou três Salinas para o povo pobre; e outrossim, não ter parte [direito] nestas Salinas, pessoa que não seja deste Distrito [...]”.

Continua...

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Nota: Os documentos transcritos são paleografados e ortograficamente atualizados pelos autores.
Artigo publicado no Jornal Diário da Manhã, no dia 14 de novembro de 2010.

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